quarta-feira, 26 de outubro de 2016

PRECONCEITOS EM ISRAEL

Por que Israel está expulsando os imigrantes africanos se precisa deles?



Nascido e criado em Israel, David Blum sempre achou que seu país era um refúgio para os perseguidos. Então por que, pergunta ele, o governo está redobrando os esforços para deportar refugiados africanos? Ele diz que essa política é uma traição às tradições de Israel - e um mau negócio, já que os africanos são a espinha dorsal do setor de restaurantes e hotéis.
"É vergonhoso", diz Blum, chefe de recursos humanos da Isrotel Ltd., que administra 17 hotéis de luxo em Israel. "Como é possível que pessoas que convivem com os traumas do Holocausto tenham uma memória tão curta?".
Mais de 45.000 africanos que buscam asilo - chamados pelos críticos de "mistanenim", que significa "infiltrados" em hebreu - moram em Israel, em contraste com 3.000 em 2006, mostram estatísticas do governo. Muitos no país dizem que os imigrantes, a maioria muçulmanos e cristãos, ameaçam a segurança e a identidade judaica do país. Em março, o governo instituiu um programa que acelera as deportações e prende muitos que se recusam a ir embora.
"O Estado de Israel não será a solução para os problemas da África", disse a ministra de Justiça, Ayelet Shaked, em uma entrevista na rádio no ano passado. A maioria dos africanos que procuram asilo em Israel "não é refugiada, mas imigrantes trabalhadores". No começo de junho, Shaked disse que novas leis vão desencorajar os africanos a ir para Israel.
Cerca de 7.000 camareiros e lavadores de pratos nos hotéis do país são imigrantes africanos, a maioria vinda do Sudão e de Eritreia, segundo a Associação Hoteleira de Israel. Essa dependência cada vez maior da mão de obra estrangeira ilustra a transformação do país, de uma sociedade de imigrantes, muitos dos quais cultivaram os campos e pavimentaram as estradas, para um país mais rico - mas também mais desigual.
Empregos não desejados
"Por trás de cada prato chique, cada quarto de hotel limpo, há um eritreu ou um sudanês", diz Daniel Assaf, chefe de cozinha de Claro, um restaurante localizado em uma antiga destilaria de Tel-Aviv que serve pratos mediterrâneos. "Exatamente quem o governo acha que vai preencher essas vagas? Os israelenses não querem esses trabalhos".
Embora a maioria dos 6,3 milhões de judeus de Israel descenda de refugiados que fugiram da perseguição, o país não tem mostrado muito apetite para acomodar não judaicos em busca de asilo. Nas últimas seis décadas, Israel aprovou apenas 200 pedidos de asilo com status de refugiado, que permitem uma estadia indeterminada, segundo a organização sem fins lucrativos Hotline for Refugees and Migrants. Milhares de outros requerentes foram deportados ou deixados em um limbo, com a exigência de renovar o visto a cada poucos meses e em constante risco de deportação.
As autoridades israelenses estão redobrando a pressão sobre os migrantes. Em 2013, Israel concluiu uma cerca de 245 quilômetros ao longo da porosa fronteira com o Egito. Menos de 70 pessoas conseguiram atravessar a fronteira desde então, em comparação com mais de 10.000 em 2012, mostram estatísticas do governo. Recentemente, o governo começou a enviar cartas a alguns migrantes dando-lhes trinta dias para escolher entre abandonar o país "voluntariamente" para ir a um terceiro país africano - com um subsídio de US$ 3.500 de Israel - ou ser preso por tempo indefinido em um edifício perto da fronteira com o Egito.
Estado inimigo
Considerando isso tudo, Musa Keeso diz que ele precisa estar mais alerta. Antes de sair do minúsculo apartamento que divide com dois amigos, Keeso confere que está levando seu visto, a conta de seu celular e a nota fiscal de sua bicicleta.
Keeso, 29, diz estar com saudades de seus pais e irmãos no Sudão, mas não pensa em voltar. Ele diz que foi torturado em um campo de deslocamento em Cartum antes de ir embora e que, se voltasse, seria preso por visitar um Estado inimigo.
Apesar de estar feliz por ganhar cerca de US$ 1.000 por mês estocando mercadorias em uma loja de departamentos, "é uma loucura pensar que viríamos aqui pelo dinheiro", diz Keeso. "A situação no meu país não está melhorando, e nunca sei o que acontecerá comigo".
Título em inglês: 'Israel Needs African Migrants, So Why Is It Expelling Them?'
Para entrar em contato com os repórteres: Yaacov Benmeleh, em Tel Aviv, ybenmeleh@bloomberg.net; David Wainer, em Tel Aviv, dwainer3@bloomberg.net

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