Achel Tinoco
Eu vim estudar em Salvador aos 17 anos. Mas queria ser jogador de futebol. Nos primeiros dias, logo encontrei uns campos de terra no Vale dos Barris para jogar. No entanto, não demorei a perceber que, se não desistisse dali, ficaria sem uma perna. Fui tentar a sorte no Bahia, lá no Fazendão. Ao chegar, um funcionário do clube me perguntou se eu aguentava com uma bola. Senti-me intimidado, mas achei que poderia responder-lhe no campo de jogo. Aí ele me fez outra pergunta ainda mais surpreendente:
— Quem indicou você?
Oxente, não entendi.
— Aqui só entra com indicação de algum deputado.
Ah, bom, ganhei a minha primeira aula sobre política. Fui-me embora aborrecido. Meu pai me disse que era melhor estudar. E era. Mas nunca desisti dos esportes. No colégio, jogava vôlei, tênis de mesa e futebol de salão. Saía-me muito bem. Ainda me aventurei no basquete, no handebol e no vôlei de praia, sem o mesmo sucesso. Resolvei tentar o boxe. Treinei, lutei por uns dois anos, mas andava ultimamente com um olho preto, aí desisti. Ed, Rubão e Ninhola que ficassem no meu lugar, na Triatlon. Mais enfronhado pelas ruas da Capital, organizei um campeonato de futebol de salão no bairro da Graça. O sucesso foi estrondoso. Pelas quadras do Wimbledon, Forest Hills, Luar de Prata e Sol da Primavera desfilaram 'estrelas' como Luiz Caldas, Lui Muritiba, Carlinhos Brown, Bobô, Sandro e Leo Oliveira (Bahia), Bigu e Bebeto (Flamengo), Jesus e Marcos Sangalo, Dante, Baíta, Osvaldo e eu, o doutor Sócrates, como me chamavam as crianças torcedoras, não pelo meu estilo elegante, mas pela barba e magreza daquele jogador do Corinthians. Não tinha outra vida. Joguei algumas vezes na Fonte Nova, pelo campeonato da Secretária de Educação, ao lado do vereador Téo Sena, e também no Balbininho, o ginásio poliesportivo Antônio Balbino — lembram-se dele? —, onde disputei campeonatos baianos de futebol de salão e de vôlei. No meu primeiro jogo, o lendário Roberto Rebouças deu no meio do meu joelho. Coitado de mim, tão magrinho! Mas no final da partida, ele veio me parabenizar pela vitória. Ao lado ainda existia a Vila Olímpica, onde mais de 600 crianças e adultos nadavam e treinavam todos os dias. Tínhamos alguma pretensão esportiva, é verdade. Até os Harlem Globetrotters andaram se exibindo por aqui. Mas uma tragédia, daquelas que todo mundo sabe que vai acontecer, sacudiu os pilares da Fonte Nova. Um buraco se abriu na arquibancada do estádio, e nova pessoas despencaram lá do alto. Morreram todas. Até hoje não sei se foram pagas todas as indenizações às famílias das vítimas. Então, vamos derrubar o estádio e levantar uma arena novinha em concreto no lugar. Não em folha, porque na capital da Bahia, parece que não se gosta das árvores, somente do concreto. Pois bem: o governo jogou tudo abaixo, e prometeu que em seis meses construiria outra Vila Olímpica no estádio de Pituaçu. E o ginásio? Ah, o ginásio somente quando o senhor Antônio Balbino de Carvalho Filho ressuscitasse. Assim, não podemos receber hoje na Bahia um jogo de futebol de salão, nem de vôlei, nem de basquete, muito menos os Globetrotters. Desse modo, o torcedor baiano não tem o direito de assistir a quaisquer esportes olímpicos, que não seja o falido futebol, justamente porque não temos onde abrigar as competições.
E por onde andam aquelas crianças nadadoras? Vá lá saber!
Ainda me lembro do barulho da bola chutada nas laterais da quadra de tatame, por causa da acústica ensurdecedora.
Ah, sim, a tal arena multiuso, que seria shopping nas horas vagas, palco para shows, encontro da juventude, não serve para quase nada, malmente para se tomar uma cerveja.
Obrigado. Essas lembranças não saem de nós, apesar do tempo e da idade. Decerto, aqueles que as tentam destruir, não tiveram infância, não sonharam, não conseguem preservar a memória. Que pena!
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