... E AQUILO QUE NÃO VÊ
Anos que, sem que ninguém me tenha ordenado cavalheiro no assunto, obrigo meu Rocinante íntimo a enfrentar, o teclado como lança, os sonolentos e ineficientes moinhos do IPHAN.
Volto hoje a
questionar o órgão federal que oficialmente fiscaliza a preservação dos bens
imateriais – missão utópica – e materiais.
Sempre atento
às queixas dos moradores de meu bairro de Santo Antônio, saí a contar uma por
uma as casas cujo último andar ostenta um terraço. Cheguei à cifra de cento e
quinze (115!) do Largo do Carmo ao Largo de Santo Antônio. Sem registrar
aqueles invisíveis a partir da rua.
Vários foram
executados sem qualquer alvará. Como, aliás, na minha própria casa, confesso,
realizada em 1985 e reconhecida como casa-museu pelo Ministério da Cultura em
2008. Já o terraço do imóvel contíguo recebeu licença explícita do IPHAN em
2006, assim como as duas casas da global Regina Casé no Largo do Carmo, com
projeto assinado por David Bastos. Que também acrescentou dois andares. A casa
do arquiteto Will Marx, na Rua Direita de Santo Antônio, possui um confortável terraço
sobre a rua, com a benção (2002) da Rita Márcia, a então implacável fiscal do
IPHAN.
A respeito da “live” orquestrada em 2021 pelo IPHAN, o arquiteto Nivaldo Brandão me responde: ”As normas e critérios de intervenção que propusemos - incluindo aquela possibilidade de, em algumas situações, construir pavimentos recuados não visíveis da rua - não entraram em vigor ainda pois o IPHAN está na etapa de análise da nossa proposta. (...) O objetivo desse trabalho que fizemos é, quando tiver sido aprovado pelo IPHAN e com as normas em vigor, evitar o casuísmo e a avaliação caso a caso que você muito adequadamente critica. ”
Já se passou mais de um ano. O IPHAN continua analisando...
O dito órgão argumenta que a visão dos telhados do
centro histórico desde o avião – quantos segundos? - é prejudicada pelos
famigerados terraços. Mas os gigantescos reservatórios de água acima dos
telhados, as placas de Eternit e outras coberturas de plástico não incomodam. E
por falar em agressão visual, os puxadinhos, esquadrilhas de alumínio ou PVC, fachadas
com antenas parabólicas e pintadas de acrílico para piso e quadras, e outras
descaraterizações, não incomodam muito mais os visitantes que passeiam pelo
bairro, observando atentamente cada detalhe?
E a escandalosa, vergonhosa, inadmissível favelização das ruas Siqueira Campos, dos Ossos, dos Carvões, da travessa Bahia, violentadas, imóveis derrubados e inteiramente reconstruídos sem qualquer alvará? E, neste exato momento, a carnavalização da Rua dos Perdões?
O Iphan é Phoda.
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