De Lima Barreto no periódico A.B.C.
de 19-10-1918:
A vida, infelizmente, deve ser uma luta; e quem não sabe lutar, não é homem.
A gente do Brasil, entretanto, pensa que a existência nossa deve ser a submissão aos Acácios e Pachecos, para obter ajudas de custo e sinecuras.
Vem disto a nossa esterilidade mental, a nossa falta de originalidade intelectual, a pobreza da nossa paisagem moral e a desgraça que se nota no geral da nossa população.
Ninguém quer discutir; ninguém quer agitar idéias; ninguém quer dar a emoção íntima que tem da vida e das coisas. Todos querem "comer".
"Comem" os juristas, "comem" os filósofos, "comem" os médicos, "comem" os advogados, "comem" os poetas, "comem" os romancistas, "comem" os engenheiros, "comem" os jornalistas: o Brasil é uma vasta "comilança".
Esse aspecto da nossa terra para quem analisa o seu estado atual, com toda a independência de espírito, nasceu lhe depois da República.
Foi o novo regime que lhe deu tão nojenta feição para os seus homens públicos de todos os matizes.
Parecia que o Império reprimia tanta sordidez nas nossas almas.
Ele tinha a virtude da modéstia e implantou em nós essa mesma virtude; mas, proclamada que foi a República, ali, no Campo de Santana, por três batalhões, o Brasil perdeu a vergonha e os seus filhos ficaram capachos, para sugar os cofres públicos, desta ou daquela forma.
Não se admite mais independência de pensamento ou de espírito. Quando não se consegue, por dinheiro, abafa se.
É a política da corrução, quando não é a do arrocho.
Viva a República!
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