segunda-feira, 6 de agosto de 2018

A DERRUBADA DA SÉ

80 anos da derrubada da Igreja da Sé

Em 7 de agosto de 1933 Salvador perdeu a sua Sé Primacial, edificada em 1552 com fachada voltada para o mar, cenário do famoso estalo relatado pelo Padre Vieira. Era uma igreja velha, mal conservada como tudo na Bahia, mas ostentava um  magnífico altar com incrustações em ouro, belas imagens e um pôr do sol exemplar, como patrimônio imaterial. No seu solo estavam enterrados ilustres e desconhecidos baianos, ossos que foram triturados pelos tratores, outros retirados às pressas, alguns restaram para a posteridade e lá estão hoje na Praça da Sé a lembrar os pecados dos protagonistas deste infeliz episódio.
A Igreja da Sé caiu para atender os interesses da Companhia Linha Circular que desejava expandir a linha do bonde e teimou que seria mais produtivo em linha reta, era preciso remover o paredão lateral do templo que ficava no final da Rua da Misericórdia. A ideia era derrubar todo um quarteirão, assim foi feito, para o bonde e o progresso passarem e foi essa proposta de modernidade que prevaleceu com o apoio das autoridades que se omitiram e da imprensa que vendeu à opinião pública o sentimento de que o monumento não passava de um “trambolho”.

Não era verdade, tinha valor histórico sim embora Dom Augusto em carta ao Papa em 1919 afirma-se o contrário, tanto que a iniciativa provocou um caloroso debate e centenas de pronunciamentos de historiadores, intelectuais, críticos de arte, baianos e alguns representantes dos mais abalizados centros de pesquisa e preservação de nossas tradições culturais. O Instituto Histórico da Bahia foi o bastião desse debate que se alongou por duas décadas, infrutífero, pois de nada valeu.
A sorte estava selada por trinta moedas, ou melhor, trezentos contos que o Cardeal da Silva recebeu como indenização com o devido aceite da Santa Sé para glória dos empreiteiros e da Companhia Circular. A igreja foi demolida praticamente às marretadas  e nesse mesmo ano de 1933 o cinema São Jerônimo pegava fogo, abrindo espaço para intervenções urbanísticas mais amplas do que o cogitado, ou dito. Essas “coincidências” que a razão não explica e nem é preciso, que a emoção acusa.
Removida a Sé, no seu lugar passaram os trilhos e onde ficava o altar erigiram um busto de mau gosto do Bispo Sardinha, nosso primeiro prelado sacrificado e comido pelos Caetetes na Foz do São Francisco. Os baianos carregaram a cruz da consciência pesada por mais de seis décadas até que em 1999, a propósito dos 450 anos da fundação da cidade, Salvador redimiu-se erigindo a Cruz Caída com que o artista plástico Mauro Cravo representou uma fratura ainda exposta de nossa história.
As fotos que ilustram este post são a primeira de autor desconhecido, do acervo da Fundação Gregório de Mattos, a segunda da coleção de Edwal Hackler.

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