Um filme tão sensível, deveria estar sendo exibido em horário nobre, do meu ponto de vista. Tem uma tristeza, uma solidão tão forte nele – e não, não é nada parecido com aqueles filmes que você começa e já sabe tudo o que vai acontecer. Apenas, a vida acontece em tantas camadas sobrepostas...
Uma interpretação perfeita. Não de um ator. Do elenco. Que coisa bem cuidada, bem dirigida. A direção dos atores primorosa, detalhista e um trabalho de construção de personagens incrível.
Quando a gente vê um filme com crianças como protagonistas, logo imaginamos que a “salvação” muitas vezes é a fofura inerente ao fato de se ser criança. Esqueçam isso. A interpretação é primorosa mesmo. Cenários quase sempre comuns, em vidas comuns. E exatamente por isso, nós somos arremessados pras nossas perdas de infância com um vigor incrível. Eu vi meu pai sair de ambulância, depois de ter um acidente vascular cerebral. A vizinha fofoqueira vindo me perguntar quem tinha saído do meu prédio, eu me ouvindo responder que não sabia pra livrar meu pai da fofoca que viria, ele inconsciente. Nunca mais vi meu pai vivo. Adivinhar que ele tinha morrido, ir avisar minha irmã – tudo isso voltou com tanta força, que nem parece que existem 50 anos separando esse dia, do meu presente, meu hoje.
A beleza do filme é você se sentir parte da vida, sentir de novo a solidão que as crianças sentem porque os adultos reagem entre si, mas não explicam o suficiente. A beleza do filme é você olhar pra trás e ainda sentir a mesma dor, como se ela estivesse de volta e nessa vida de adulta, se reencontrar com você-criança.
Depois que meu pai morreu, minha família nunca mais se reuniu em nenhuma festa e nem comemorou nada. Minha mãe nunca foi de festas. Mas minha pequena família, sempre tentou estar presente dentro daquele nucleozinho. Acho que é mesmo isso – todas somos solitárias e aprendemos a viver assim, o que acaba na mesma hora em que percebemos que somos necessárias. Eu já fui uma das mãozinhas que se esticavam no ar como no filme e quando estou em casa, parece que o tempo me leva para uma emoção muito próxima desse mesmo lugar.
Como um filme com tantas sutilezas não está passando às 20 horas, eu honestamente não sei. Como nós nos separamos das mãozinhas que abraçam, fazem graça pra você rir e ocupam o espaço, dançando e gracejando? Como perdemos de vista a preocupação das crianças com as “nossas encrencas” adultas? Como definir as formas de expressão de amor existentes, o bom humor esbarrando em barreiras adultas tantas vezes intransponíveis pra todos nós? Como suportar o olhar de tristeza que as crianças têm, tantas vezes diante da vida?
Eu fiquei tão tocada, que não soube bem o que dizer a Ana, na saída do cinema. Então não disse nada. Fizemos o percurso do Paseo até o carro em silêncio, vendo e sentindo o sol apenas. Muitas outras solidões aconteceram e vão acontecer. A ideia de uma família com cunhados, tios, primos é isso mesmo – uma ideia. Mas há um amor e uma busca por amor dentro dessa solidão também.
Há filmes assim. Tão intensos, tão importantes que a gente precisa de um pouco mais de tempo de digestão emocional. O menino que fazia rir sem dúvida, é um deles.
Ana Ribeiro, diretora de cinema, teatro e TV
Alguns filmes parecem feitos com as nossa recordações, as nossas dores, lembranças dolorosas, ou sorridentes, de criança. Como as vidas podem ser tão dolorosamente semelhantes, sendo diferentes? Podem. Oh, se podem. Neste filme, quase consegui sentir os cheiros e sabores da infância. Uma família numerosa cheia de vida, de aliados, de momentos deliciosos. Pessoas se preocupando umas com as outras. Vidas dedicadas a outras vidas e transformando tudo em felicidade, em bem estar e paz para todos.
Impressionante como alguns filmes são tão realistas, que parecem reais. Extraordinária produção e realismo. Os planos de filmagem parecem os nossos olhos. Quase parece que fazemos parte da família. Atores extraordinários, principalmente o “menino que fazia rir”. Que ator extraordinário, que menino lindo e fofo, expressivo.
Em criança, os momentos da vida são vividos com muita intensidade e isso aumenta muitas vezes por que nem sempre se conta tudo às crianças. Mas este menino teve a possibilidade de ser tratado como alguém que fazia parte. O que queria saber, era respondido. O que precisava, algum adulto resolvia. E tudo com carinho, preocupação, com espirito de família.
Pessoas determinantes na força e estabilidade da família foram adoecendo e você vai sentindo a energia diminuindo. O mundo se abatendo em todos. Mas mesmo nesses momentos, a família prevalece e algo se pode fazer. Por mais pequeno que seja, algo se pode construir.
Este menino, extremamente sensível, sugou tudo de uma forma muito intensa e sempre teve o humor como uma forma de fintar o sofrimento. Muito bonito e muito triste também o filme. Nos recorda melancolicamente momentos da nossa vida de meninos que víamos as coisas mudarem sem entendermos e/ou sem nada podermos fazer.
Este filme mostra que existe sempre uma saída, sempre uma forma boa de nos salvarmos da infelicidade, sofrimento e abandono. Um filme muito interessante para ser visto por crianças que adquirem raiva, mágoa e rancor com o que sucede nas suas vidas.
Ana Santos, professora, jornalista
Informações sobre o filme
Circuito Saladearte
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