Caro governador Rui Costa,
Trago-lhe notícias da decadência da Biblioteca Pública do Estado da Bahia, criada em 1811 e instalada em 1970 nos Barris, centro de Salvador, sob a responsabilidade do governo do Estado. Sem querer contrariar a irrelevância da cultura em seu governo, informo-lhe que a velha biblioteca continua a não receber nenhuma assinatura de jornais locais e nacionais. A seção de consulta a periódicos, antes repleta de frequentadores, sofre um processo de desertificação. Visitantes retornam para a rua ao verificar que não há jornais do dia. São quase dois anos de incúria, de estúpida austeridade e de grosseria contra leitores e pesquisadores. Um ato de desprezo à memória histórica da Bahia. De acordo com os funcionários, desde junho de 2016 a remessa de publicações foi cortada em razão de estranhas burocracias, inéditas em quase dois séculos de serviços públicos, agora humilhados pelo desinteresse oficial de solucionar esse impasse.
Conforme apurei, usuários e funcionários chegam a doar seus jornais para corrigir parte da lacuna do acervo da biblioteca. Esta história é comovente, mas deveria lhe indignar tanto quanto a mim, porque o dinheiro para a manutenção é mínimo. Uma assinatura do jornal “A Tarde” custa R$ 65 por mês (felizmente, a maior parte do acervo está digitalizada). O “Correio” custa uma pechincha: pode sair R$39/mês. Como se vê, nada que ofenda o erário.
Na Biblioteca dos Barris, realizei pesquisas em 2016 e 2017 e posso descrever o zelo de funcionários jogados em ambientes sem ar condicionado, outro atentado contra o acervo. O calor reduzia a capacidade de resistência, o tempo de pesquisa se reduzia. E cabe uma pequena atualização: a sala de consultas a periódicos se encontra outra vez sem ar condicionado. Quebrou. Em 22 de fevereiro de 2018, crescia a esperança de um conserto.
Os banheiros da biblioteca são sujos, fedem a urina e dezenas de vasos seguem interditados. Os mictórios são podres. Não há motivo para vanglória: isto não é um feito de sua gestão. O desrespeito à higiene dos usuários atravessa décadas e não exclui governantes de esquerda ou direita.
O PT, defensor das minorias, deveria proteger a saúde de raros leitores. Há pouco tempo, houve cortes indecentes na limpeza e na segurança, mesquinharia revertida dentro da lentidão habitual de tudo que se refere à preservação histórica no Brasil. Em 2016, a biblioteca fechou por 20 dias. Os vigilantes não eram pagos, como denunciou a imprensa.
Antes do fim, vamos rapidamente ao subsolo. A Sala Walter da Silveira, antes uma referência da cinefilia baiana, dispõe de um excelente programador, mas recebe recursos pífios para realizar mostras e retrospectivas de filmes. Seja mais generoso com a sala que leva o nome de um dos maiores críticos do Brasil.
Apesar do meu desencanto, espero que o senhor corrija o descaso de seu governo com a Biblioteca Pública. Esta carta, naturalmente, será encaminhada a outros destinatários dedicados à memória histórica.
Cordialmente, Claudio Leal, jornalista e pesquisador.
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