“Play it again, Sam” nunca saiu da boca de Ingrid Bergman no filme “Casablanca” que nunca foi filmado na dita cidade. Mas um trecho da obra-prima, outro do musical “Hair” assim como a bomba atômica sobre Hiroshima y muchas cositas más você encontrará nos monólogos de Rita Assemany, se tiver a louvável iniciativa de reservar seu lugar na República de Aninha Franco, que continua resistindo. Resistindo neste Pelourinho decadente que burgueses odeiam e que nós, nem drogados nem marginais, adoramos.
Teimosa esta senhora. Nada fácil. Eu - que tão pouco sou lá muito fácil - que o diga. Tivemos nossas divergências e convergências durante estes mais de trinta anos de vizinhança. Assinamos colunas simultâneas na Gazeta Mercantil e n´A Tarde. Mas como duas pessoas que se respeitam podem viver vidas estritamente paralelas no mesmo espaço/tempo? Apesar dos pesares, muito te admiro, Aninha!
Foi uma bela aventura quando em 1987 consegui levar - sem o mínimo ônus, vale lembrar, para os cofres públicos tupiniquins – uma boa dúzia de baianos até o Festival de Teatro de Casablanca para apresentar esta pequena joia aninhesca chamada “Dendê e Dengo”, um dos trabalhos mais felizes da teatróloga Carmen Paternostro. O cenógrafo Gilson Rodrigues, três capoeiristas, primeira e talvez única viagem fora do Brasil do fotógrafo Adenor Gondim... Em Marrakesh foi difícil obter licença para jogar capoeira na lendária Praça Djma El Fna. O sucesso quase virou motim.
Voltando à casa da rua das Laranjeiras. Esta república é mais para império dos livros. Você penetra num labirinto de estantes preservando uma bela fatia do conhecimento universal. Tudo muito ordenado. Desce uma escada estreita para se deparar com uma vista cinematográfica do muito bem iluminado Lar Franciscano dominando o bairro da Saúde e a Baixa dos Sapateiros.
Todo mundo chegou? Abre-se a porta para uma caverna urbana. Vinte cadeiras dispostas contra três paredes, a quarta sendo palco, pista de dança e confessionário onde cantos, gritos e sussurros lhe levarão durante uma curta hora por horizontes lúdicos do pensamento e da memória. Mas viagens cansam e dão fome. Duas mesas nos esperam. Sempre escolho a menor, com confortáveis cadeiras de braço e almofadas. Minhas costas agradecem. Janta tardia, mas bem-vinda e saborosa. Meu Pinot noir chileno, perfeito. Lá você poderá sentar-se com o artista do momento, a jornalista que acaba de chutar as convenções, a psicanalista que trocou ontem a cama do filho adolescente por uma de casal, o cardiologista que acaba de chegar do Cairo e um pai-de-santo. A politicagem não soube preservar as magias do Teatro XVIII – hoje, uma sinistra ruína – mas Aninha tem sete vidas. Aninha é uma salamandra.
Dimitri Ganzelevitch
A Tarde 08/02/20
Excelente descrição!!!
ResponderExcluirAplausos!!!
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