ASCÂNIO SELEME
Uma grande novidade pode ocupar o cenário político nacional no próximo domingo. Guilherme Boulos, que há dois meses era apenas um dos diversos postulantes ao principal cargo em disputa nas eleições municipais deste ano, transformou-se na sensação da campanha e, em três dias, pode perfeitamente ser eleito prefeito de São Paulo. Votos para isso ele parece ter reunido, de acordo com as pesquisas. O importante a discutir agora é se esta é a melhor hora para Boulos.
A simples presença do candidato do PSOL nesta altura da campanha já areja o ambiente bastante intoxicado desde a eleição do presidente de extrema-direita. Embora o centro e a centro-direita tenham saído dominantes do primeiro turno, diminuindo o tamanho e o espaço de Jair Bolsonaro, a principal joia da coroa está em disputa entre um candidato de centro-esquerda e um de esquerda. Não há como negar, a prefeitura de São Paulo é a mais importante do país e tem orçamento e receita maiores que pelo menos uma dúzia de estados brasileiros.
Politicamente, o prefeito de São Paulo é mais visível e mais preponderante do que qualquer governador, mesmo os de Rio e Minas. Ou alguém acha que Cláudio Castro e Romeu Zema têm um futuro tão amplo quanto Bruno Covas? Tomem a trajetória de João Doria como exemplo. Por isso, o caminho que se abre para Boulos é enorme. Se vencer a eleição, ganha uma projeção que nem os maiores líderes de seu partido jamais conseguiram alcançar.
O problema é como administrar a vitória. Como governar a maior cidade do país mantendo relevância e sem queimar capital político. A primeira questão para Guilherme Boulos, no caso de ser eleito, é a montagem do governo. Quem ele trará para a administração municipal para encaminhar as propostas que apresentou ao eleitor durante a campanha. Como seu partido é pequeno, terá de buscar quadros fora do PSOL, principalmente no PT. E essa pode ser a primeira armadilha que vai enfrentar.
O perigo para Boulos é ser tutelado pelo PT, ou pelo menos ser visto de fora dessa maneira. O risco de ser considerado um braço político do partido de Lula e do próprio ex-presidente é enorme. Não há como governar sozinho, claro, não se toca uma cidade como São Paulo sem um imenso anteparo político. E daí pode nascer a percepção de que Boulos é apenas um novo líder do PT, desidratando o PSOL, que nasceu justamente porque um grupo de petistas discordou dos métodos do partido e se afastou da onda de escândalos daquela era.
A crise econômica que o mundo atravessa em razão do coronavírus é outro problema que pode fazer fracassar um hipotético governo Boulos. Se o programa de governo do candidato exige gastos muito acima do que o município pode arcar em tempos normais, imagine nesta época de vacas magras. E aí cresce a possibilidade de o novo prefeito acabar traindo, mesmo que involuntariamente, seus compromissos de campanha, suas promessas eleitorais, decepcionando os eleitores e enfraquecendo seu partido.
Talvez, e você pode discordar inteiramente, seja melhor para Boulos perder esta eleição. Da mesma forma que foi bom para Lula ter perdido para Fernando Collor em 1989, ele próprio já reconheceu isso. Se sair da eleição com 45% dos votos válidos, como mostrou a última pesquisa Datafolha, se cacifará para se tornar um grande nome em 2022. Como sua curva é ascendente, pode encostar ainda mais em Covas, fortalecendo e amadurecendo a si próprio e ao PSOL, como Lula e o PT também amadureceram.
Mas a alternativa da derrota também guarda um problema. Será que Lula vai permitir que uma luz brilhe mais forte que a sua ou do seu partido? Com todo o poder que tem sobre o PT, Lula não evitou a candidatura de Jilmar Tatto, mesmo quando Boulos já era a alternativa viável. Por quê? Porque não quis. Alegar democracia interna é bobagem. Em 2018, rifou Marília Arraes em Pernambuco, atropelando o diretório regional. Como não dá para confiar em Lula, quem sabe seja esta mesmo a melhor hora para Guilherme Boulos, apesar de todos os riscos.
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