Disputa familiar por espólio leva polícia a vasculhar casa de ACM
Na manhã de ontem, a porta do apartamento da viúva do senador Antonio Carlos Magalhães, dona Arlette, foi aberta por dois chaveiros. Junto a eles estavam dois oficiais de Justiça e mais seis soldados e três oficiais da Polícia Militar da Bahia acompanhados de quatro advogados do empresário César Mata Pires, sócio da construtora OAS e genro de ACM. Os oficiais de Justiça chegaram em carros cedidos pela construtora para cumprir uma ordem judicial de avaliação dos bens do ex-senador.
A família do político baiano, falecido em julho de 2007, contou em nota enviada à imprensa o acontecido e repudiou o ato, considerado "brutal e violento". A ordem judicial foi dada pela juíza auxiliar da 14ª Vara de Família, Fabiana Andrea Almeida Oliveira Pellegrino. Fabiana é casada com o deputado federal Nelson Pellegrino, virtual candidato do PT à eleição municipal. Caso o partido decida por sua candidatura, o petista terá ACM Neto (DEM) como um de seus adversários no pleito.
Mata Pires é casado com a filha de ACM, Teresa e possui 90% da construtora OAS. Ele e a esposa brigam com outros membros da família pelo espólio do senador. Após a morte de ACM, Mata Pires tentou comprar a parte de Antônio Carlos Magalhães Jr. (33%) na Rede Bahia, empresa de comunicação que reúne a TV Bahia e outras afiliadas da rede Globo no Estado, o jornal "Correio da Bahia" e rádios. ACM Jr. rejeitou a proposta e se uniu aos herdeiros de Luís Eduardo Magalhães, que detêm mais 33% da rede, contra Mata Pires. Teresa, sua esposa, ficou sozinha com seus 33% e, nas decisões votadas pelos acionistas, é sempre vencida. Arlette, a viúva, tem o 1% restante do conglomerado.
Teresa ingressou na quarta-feira da semana passada com uma ação pedindo a avaliação dos bens do senador. Após dois dias a juíza Fabiana concedeu a liminar que dava um prazo de 48 horas para que Arlette Magalhães prestasse todas as informações pedidas pela filha na ação judicial. Na segunda-feira à tarde dois oficiais foram à casa da viúva, mas ela não estava. Ontem voltaram e, sem encontrar Arlette ou empregados no apartamento, mas com a autorização da juíza, entraram com a ajuda dos chaveiros.
Familiares calculam que os bens do senador ACM chegam a cerca de R$ 325 milhões. Só a Rede Bahia é avaliada em R$ 300 milhões. Os outros R$ 25 milhões são referentes a obras de arte, dentre eles, uma coleção de arte sacra. O senador deixou de herança três apartamentos: uma na avenida Vieira Souto, no Rio de Janeiro, e mais dois em Salvador, entre eles o que fica na Graça, bairro nobre de Salvador, e onde os oficiais entraram. Há ainda uma casa em Brasília, ações do Bradesco, Banco do Brasil, Cia. Vale do Rio Doce e Petrobras, além das obras de arte. ACM gostava de coleções e tinha, inclusive, um peculiar conjunto de paliteiros.
O senador Antonio Carlos Júnior (DEM-BA) acusou a juíza de ter sido "precipitada e partidária" e disse que sua família vai recorrer da decisão "às instituições superiores". Segundo ele, há "motivações políticas" por trás da ação. Considerou um "direito" de uma pessoa pedir avaliação dos bens de sua família, mas a ação foi realizada com uma violência e agressividade desnecessárias "com uma senhora indefesa". O mandado, segundo ele, tinha prazo de 48 horas para ser cumprido, mas isso aconteceu em apenas 24 horas. "E com ajuda de força privada, carro da família de Teresa", afirmou ACM Júnior.
A ação policial provocou uma sucessão de protestos no Congresso. O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), designou uma comissão para propor providências que o Senado pode tomar em defesa da viúva de ACM.
A comissão é composta dos líderes do DEM, José Agripino (RN), do PSDB, Arthur Virgílio (AM), e do PT, Ideli Salvatti (SC). "Não quero entrar em questões de família, em disputa de espólio, mas não posso deixar de manifestar meu repúdio pessoal à truculência com que o apartamento, a residência, o lar onde mora dona Arlette foi invadido mediante ordem judicial concedida por uma juíza de Salvador, por acaso esposa do deputado Nelson Pellegrino, do PT da Bahia", disse Agripino.
O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), um dos parlamentares mais próximos de ACM, manifestou "revolta e indignação" com o episódio, que julgou inadmissível. "O senador José Agripino não quer fazer a ilação, mas eu a faço, porque não acredito que ninguém de bom senso neste país, conhecendo dona Arlette, pudesse promover invasão policial armada ao seu apartamento, ao seu lar. Isso é inadmissível! Só alguém que tivesse algum tipo de preconceito, de prejulgamento ou de rancor injustificável guardado em seu coração faria isso", disse o ex-presidente do PSDB, referindo-se ao fato de a juíza que determinou a ação judicial ser mulher de um deputado que sempre foi adversário de ACM.
Depois de elogios à dona Arlette, o senador Marco Maciel (DEM-PE) considerou os fatos "extremamente graves" e exigiu esclarecimentos, "até porque isso pode representar um grave precedente que não pode ser repetido. Devemos apurar devidamente esses fatos".
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