Era uma praia simples e charmosa como tantas outras pelo Brasil afora. Um pedaço de mata atlântica ocupado por uma aldeia singela de pescadores. Canoas balançando. Coqueiros, hibiscos e flamboyants. Caymmi, Caymmi, Caymmi.
Novembro de 1975. Mal aberta minha galeria da Sereia no Largo
do Pelourinho, 12, térreo do IPAC, organizei um piquenique de artistas. Num
domingo de estradas desertas, fomos em três carros, atravessando o rio - cujo
nome não consigo me recordar – de balsa. A dita balsa avançava lentamente por
meio de dois homens andando numa corda lateral à embarcação. Alguém, por favor,
poderia explicar melhor? Um carro de cada vez.
A pista vermelha passava perto de ruínas imponentes antes de
chegar ao povoado. Pertenceram ao cruel Francisco Dias d´Ávila no século XVI.
Não sabíamos que a praia, o castelo e o povoado já tinham
sido comprados pelo alemão paulista Klaus Peter. Homem afável que cheguei a
encontrar por várias vezes enquanto o cuidadoso projeto do arquiteto Wilson
Reis Netto começava a surgir sem pressa. Me encantei com a proibição de agredir
a natureza, de não permitir construções que ultrapassassem a cimeira das
árvores. Como em Marrakesh. Os dois visionários souberam resistir aos ataques
ferozes da imprensa baiana quando o Klaus era tratado como ditador e outros
insultos ainda mais contundentes.
Sempre defendi o projeto que, ao longo dos anos, mereceu uma
repercussão internacional. Um casal amigo, paulista, teve durante uns anos uma
casa cinematográfica cujas paredes se levantavam servindo de para-sol, casa
também projetada por Wilson Reis.
Mas o sucesso é uma faca de dois gumes.
Voltei numa sexta-feira de agosto para participar, com meu
livro sobre os carros de cafezinho, da 3ª Feira Literária Internacional. Deste
evento prefiro não falar. Desisti após uma hora, voltando para Salvador. Amigos
me perguntaram; “Mas porque, ao menos, não aproveitou sua reserva de duas
noites na pousada para curtir a Praia do Forte?!”
Porque odeio shopping centers e é exatamente nisso, num
centro comercial a céu aberto, que se transformou aquilo que outrora fora um
éden. Você anda por ruas e travessas onde lojinhas, restaurantes, agências
imobiliárias e pousadas se sucedem sem tréguas, em arquiteturas bizarras que se
pretendem rústicas. A cada passo Klaus Peter é ridicularizado, Wilson Reis
agredido.
Meu sonho de consumo continua sendo a Casa de Vidro da longa praia
de Bainema na ilha de Boipeba e o despretensioso Pontal onde dividia com
queridos amigos um inesquecível risoto de lagosta preparado pelo
advogado-pescador Henrique “Cação” Maciel. Não quero saber de butiques
“tendência”, de restaurantes para influencers e pousadas cuja diária oscila
como a Bolsa de Wall Street. Só quero mar e silêncio.
Dimitri Ganzelevitch
A Tarde, sábado 20 de agosto 2022
Bem sei como se sente. Ao longo da minha existência já um tanto longa, vi alguns paraísos se perderem, o subúrbio ferroviário depois da Avenida Suburbana, a Ilha de Itaparica depois do sistema Ferryboat, o litoral norte especificamente incluindo Monte Gordo/ Guarajuba, Barra de Pojuca e Praia do Forte depois da Linha Verde . Bem disse um pescador da Ilha de Maré numa entrevista na televisão, " quando o progresso chega, a desgraça vem atrás" Diante dessa realidade o melhor , é seguir o conselho de quem disse, não me lembro se poeta ou filosofo, que não se deve voltar aos lugares que nos foram caros após alguns anos. A decepção acompanhada de tristeza é grande. Isso também pude constatar. É sina dos paraísos. O homem chega, se encanta com o paraiso e trata de transformá-lo no inferno com que está acostumado. E tem mais um paraíso com morte anunciada, a Praia do Garcez que dizem vai virar cidade chinesa com prédios de 30 andares
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