Na ONU, Brasil é denunciado por ofensiva de evangélicos contra indígenas
Seguranças privados queimaram casas Guarani Kaiowá, em Dourados (MS), em setembro Imagem: Povo Guarani Kaiowá/Divulgação
Jamil Chade Colunista do UOL
Indígenas denunciaram o Brasil na ONU, nesta quinta-feira, diante do "aumento sistemático da violência" motivada por intolerância religiosa e a queima de casas de reza. Num discurso no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, Tatiane Sanches, do povo Guarani Kaiowá, criticou "religiosos fundamentalistas" e pediu que a relatoria da ONU cobrasse o governo brasileiro por proteção.
A questão religiosa é um dos carros chefes da agenda brasileira de direitos humanos, sob a orientação da ministra Damares Alves. Mas, para os indígenas, o governo não atua para proteger todas as religiões da mesma forma.
Como indígena Kaiowá, venho a este conselho denunciar o aumento sistemático da violência contra nossa crença milenar. Nossas famílias e líderes religiosos estão sendo perseguidos por religiosos pentecostais fundamentalistas, que violam nossos direitos, corpos, mentes e casas sagradas", disse a representante. "A cada dia, igrejas evangélicas fundamentalistas invadem nossos territórios, deixando um rastro de extermínio cultural. Queimar uma casa de reza representa uma violência tão profunda que atinge nosso corpo, mente e alma ", denunciou a indígena.
Em seu discurso, Tatiane fez um apelo para que relator especial da ONU que questione o Brasil sobre as ações tomadas para proteger as as casas de reza Kaiowá e Guarani e sobre as iniciativas tomadas para "condenar rigorosamente todos estes atos" cometidos por fundamentalistas contra a espiritualidade tradicional indígena.
De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), os atentados contra a espiritualidade indígena intensificaram-se nos últimos três anos. "Segundo a Aty Guasu - Grande Assembleia dos povos Kaiowá e Guarani, pelo menos sete casas de reza foram criminosamente incendiadas em 2021 em Mato Grosso do Sul", explicou a entidade num comunicado.
"Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, tivemos uma das maiores casas de reza do meu povo criminalmente incendiada por apoiadores do governo", Tatiane. No mês de julho daquele ano, um incêndio criminoso destruiu a casa de reza da aldeia Jaguapiru, na reserva indígena de Dourados (MS). A indígena é neta da liderança espiritual Guarani Kaiowá, a nhandecy - rezadora - Roberta Ximenes, do tekoha Jaguapiré, no município de Tacuru (MS).
Em março de 2020, sua ogapysy foi destruída pelo fogo, alvo da intolerância religiosa. "Em 2020, minha avó Roberta Ximenes, de 82 anos, uma liderança religiosa do meu povo, teve sua casa de reza incendiada. Nela, minha avó protegia objetos sagrados do meu povo que tinham mais de 200 anos", disse Tatiane. "Naquele ano, outras duas casas foram queimadas, e em 2021 outras oito casas de reza foram destruídas".
Em Rancho Jacaré, localizado no município de Laguna Carapã (MS), o local de reza foi destruído por chamas pelo menos duas vezes no ano de 2021 - a última delas em outubro, dois meses após sua reconstrução. "Até a casa do rezador da comunidade foi alvo da ação de fundamentalistas religiosos", apontam.
Segundo o CIMI, além do contexto de intolerância e do simbolismo que representa a queima de objetos sagrados para o povo indígena, o fogo também é utilizado como um elemento de intimidação contra comunidades em retomadas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário