Paulo Ormindo de Azevedo
Belchior, poeta e cantor, passou pela vida como o rei mago que doou o brilho do ouro e desapareceu. Nascido em Sobral, CE, de origem sefardita, foi cantador e repentista em feiras. Em 1962, mudou-se para Fortaleza, onde frequentou colégio de padres, estudou filosofia, canto coral e se recolheu ao Mosteiro de Guaramiranga, de frades italianos. Cursou medicina pela metade e a abandonou para se dedicar à música.
Belchior encontrava alívio para suas angústias existenciais no canto compartilhado, filosofando sobre a vida e a morte, a inexorabilidade do tempo, a relatividade da verdade e da felicidade, mas também sobre o amor, a arte e o futuro. Meu bem, talvez você possa compreender a minha solidão./ O meu som e a minha fúria e essa pressa de viver/ e esse jeito de deixar sempre de lado a certeza/ e arriscar tudo de novo com paixão [...] Meu bem, vem viver comigo/ vem correr perigo/ vem morrer comigo (“Coração Selvagem”, Inspirado em C. Lispector).
Era feito aquela gente honesta, boa e comovida/ que caminha para a morte pensando em vencer na vida (Pequeno perfil de um cidadão comum). No fundo do prato, comida e tristeza/ a gente se olha, se toca e se cala/ e se desentende no instante em que fala (Na hora do almoço). A minha alucinação é suportar o dia-a-dia/ e meu delírio é a experiência com coisas reais:/ um preto, um pobre, um estudante, uma mulher sozinha (Alucinação). A felicidade é uma arma quente, quente (C. a respeito de John).
Como a supernova da anunciação de Jesus, ele estourou nas rádios e TVs e desapareceu.
SSA: A Tarde, 07/08/2022
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