sexta-feira, 16 de abril de 2021

OS MULATOS DO SADO

 

Em Portugal, na zona de Alcácer do Sal e de Grândola existem hoje traços da presença de mulatos. Mas qual é a sua origem e a sua história? Como chegaram até aqui?



Durante séculos, a Lezíria e a Ribeira do Sado encontravam-se desabitadas, graças à fama de serem um território insalubre, rodeado de gândaras e charnecas.

Assim, apenas trabalhadores temporários por ali se encontravam, funcionando o rio como uma autêntica via de comunicação e escoamento dos produtos locais, como o sal, que desde pelo menos o século XVI a meados do século XX constituiu a principal atividade económica da região entre Alcácer e Setúbal.

O paludismo, antigamente conhecido como febre terçã ou sezões, era um mal endémico no local, correndo hoje a versão de que a população existente no território do Sado antes do séc. XX era constituída por africanos, supostamente imunes à doença, que aí foram fixados pela Coroa como forma de assegurar a agricultura da região.

Não se sabe se a história é lenda ou não, mas a verdade é que Leite de Vasconcelos, na sua Etnologia Portuguesa, faz referência aos chamados pretos de Alcácer (ou mulatos da Ribeira do Sado), tendo os habitantes desta região nítidos traços africanos.

Em cancioneiros populares, podem-se encontrar também referências a esta característica:

Ribeira do Sado,
Ó Sado, Sadeta.
Meus olhos não viram
Tanta gente preta.

Quem quiser ver moças
Da cor do carvão
Vá dar um passeio
Até São Romão.

(do cancioneiro popular de Alcácer do Sal, Alentejo, sul de Portugal)

A Ribeira do Sado corresponde à região que se prolonga ao longo do vale do rio Sado, seguindo de Alcácer do Sal para montante, não muito longe de Grândola. O São Romão da canção corresponde a uma aldeia da região.


Quem por estas bandas passear hoje em dia, não verá uma população propriamente negra, nem “moças da cor do carvão”, já que a mestiçagem se consumou já por completo.

No entanto, ainda são evidentes alguns traços físicos, bem como a cor de pele mais escura, que nos remetem para a África. São os chamados mulatos de Alcácer, por vezes também designados de carapinhas do Sado.

O seu aspecto é semelhante ao de muitos cabo-verdianos, apesar de não terem quaisquer laços com a silhas crioulas. São completamente alentejanos, filhos, netos e bisnetos de portugueses.

Atribui-se frequentemente a iniciativa de fixar populações negras na região ao Marquês de Pombal, mas existem registos paroquiais e da Inquisição de épocas anteriores que referem a existência de uma percentagem elevada de negros e mestiços na região. Segundo estes registos históricos, já no séc. XVI havia pessoas de cor negra nas terras de Alcácer.

Até há menos de cem anos, o paludismo era um problema grave na região, conhecida hoje pelo cultivo do arroz, graças às suas terras alagadiças. A mortalidade causada pela doença fazia com que as pessoas não se fixassem na região. Para cúmulo, no séc. XVI muitos portugueses embarcaram nas naus.

Assim, esta terá sido a razão para, na época, os proprietários de terras do Sado terem comprado no mercado escravos negros. Assim, os mulatos do Sado dos nossos dias são os descendentes desses antigos escravos negros.

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