No século XVIII, o índigo chegou à Europa e tornou-se muito popular porque proporciona uma cor estável, que resiste à lavagem e à exposição solar, e produz uma variada gama de azuis.
Na natureza, a cor azul é rara, quando comparada com a ubiquidade do verde, do amarelo ou do laranja.
Em geral, a cor azul encontra-se nas pétalas das flores e nos frutos, onde desempenha uma função ecológica para atrair animais polinizadores (flores) e dispersores de sementes (frutos). Nestas estruturas, as moléculas responsáveis pela cor azul são, em geral, antocianinas, compostos que têm crescente interesse na investigação alimentar e farmacêutica, devido à sua atividade antioxidante.
A primeira anilina
Atualmente, os corantes utilizados nas indústrias de tecidos são quase todos de origem sintética (anilinas). A primeira anilina (mauveína) foi criada, acidentalmente, por William Henry Perkin (1856), quando, com a idade de apenas 18 anos, procedia a ensaios para sintetizar quinino (antipalúdico) por via química, a partir de alcatrão de hulha.
O seu objetivo era encontrar um medicamento que prescindisse da casca (súber) das quineiras (género Cinchona), nativas da América do Sul. Na década de 1890, a mauveína foi tão popular que passou a conhecer-se como década malva, e até a rainha Vitória se vestiu com tecidos tingidos desta cor, que evoca a cor da púrpura imperial.
Isatis tinctoria – Planta de onde se extrai o pastel.
Primeiro corante azul – o pastel
Durante milénios, os europeus que desejavam obter um corante azul estável para tingir tecidos recorreram às folhas da planta-do-pastel (Isatis tinctoria L.), que pertence à família das couves ( Brassicaceae ).
Este corante (indigotina) é obtido após um conjunto complexo de processos fermentativos (bactérias) e oxidativos (enzimas da própria planta e exposição ao oxigénio atmosférico).
O nome pastel deriva de uma etapa final do processamento das folhas, antes da secagem das mesmas, quando se manufaturam pequenas esferas pastosas.
O pastel foi utilizado pelos pictos (latim picti = pintados), povo que habitou a região que hoje corresponde à Escócia e contra o qual os romanos construíram uma muralha defensiva (Muralha de Adriano), para pintarem o seus corpos, antes das batalhas, e, deste modo, causar maior pânico nos adversários – o pastel também tem propriedades anti-inflamatórias e hemostáticas que podem ter contribuído para justificar essa prática.
Durante a Idade Média, o principal centro europeu de produção e comércio de pastel foi a cidade francesa de Toulouse, onde, ainda hoje, se encontram oficinas tradicionais que utilizam esta matéria-prima, assim como edifícios monumentais que testemunham o seu glorioso passado.
Em Portugal, foi no arquipélago dos Açores que o cultivo de pastel teve uma maior expressão económica (século XVI-XVII), sendo este período da história económica açoriana conhecido como Ciclo do Pastel. Este corante, juntamente com a urzela (líquen do qual se obtém um corante púrpura) eram as principais exportações do arquipélago.
A origem do azul-índigo
A partir do século XVIII, um outro corante azul de origem vegetal começou a chegar à Europa, em quantidade e preço que o tornaram imediatamente popular – o índigo (anil). Esta substância já era conhecida dos europeus, mas a sua produção e preço não lhes tinham permitido competir com o pastel.
O índigo, que dispensa o uso de mordentes (substâncias que auxiliam a fixação permanente dos corantes às fibras), tornou-se muito popular porque proporciona uma cor estável, que resiste à lavagem e à exposição solar, e produz uma variada gama de azuis.
O azul índigo pode ser obtido a partir de plantas pertencentes a vários géneros, sendo o género Indigofera o mais importante; neste, a espécie Indigofera tinctoria L., nativa da Índia e Sudeste da Ásia, é que tem uso mais generalizado.
O nome do género foi escolhido por Carl Linnaeus (1707-1778), com base no grego indikón = azul-indiano (nome atribuído a um corante azul que provinha da Índia) e no sufixo latino -fera = que tem, que produz, ou seja, planta que produz azul-índigo.
Indigofera tinctoria – Planta de onde se extrai o índigo.
Cultivo das plantas de índigo
Tradicionalmente, as plantas de índigo colhem-se quando atingem três meses de idade, colocam-se em tanques com água, pressionam-se e a solução aquosa resultante passa para um outro tanque. Neste, existem trabalhadores que introduzem oxigénio na solução, agitando-a com movimentos sincronizados dos seus corpos.
Finalmente, a solução repousa para que o índigo precipite; o sedimento é retirado, aquecido (para perder água) e, finalmente, molda-se em blocos que se secam ao sol. São estes blocos (inteiros, fragmentados ou pulverizados) que seguem, posteriormente, para o mercado internacional.
A importância e simbologia do azul-índigo
A demanda europeia por índigo teve início no final do século XVIII e continuou durante todo o século XIX para responder às crescentes necessidades das indústrias de tecidos inglesa, europeia e norte-americana. Para satisfazer a crescente procura, estabelecem-se plantações nas colónias europeias das Índias Ocidentais (Caraíbas), nos EUA e na Índia. Neste subcontinente, a Companhia das Índias Inglesa impôs um tipo de produção e comércio de índigo que conduziu à Revolta do Índigo (1859) – quando os pequenos proprietários se revoltaram contra os baixos preços desta matéria-prima.
O azul índigo é um símbolo cultural de várias sociedades humanas, como os tuaregues – povo nómada que habita no deserto do Saara e cujos homens cobrem a cabeça com tagelmusts tingidos de azul-índigo e nos quais o tipo de tecido e a tom de azul mostram a sua importância social.
No Ocidente, o índigo é conhecido pela cor azul das calças de ganga (jeans), modelo 501, patenteadas, em 1873, por Levi Strauss (1829-1902) e que, a partir da última década do século XIX, começaram a ser tingidas de azul (atualmente, o azul das calças de ganga provém de anilinas).
Nas décadas de 1960/1970, estas calças foram adotadas pelos jovens europeus e norte-americanos como um símbolo de rotura, um ícone de liberdade e emancipação ao qual o azul-índigo ficou associado.
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