domingo, 10 de janeiro de 2021

O PANORAMA VISTO DA PONTE



Paulo Ormindo de Azevedo

A peça de Arthur Miller se passa em NY, na década de 1950. Seu protagonista é um estivador ítalo-americano que hospeda dois imigrantes ilegais à custa de explodir sua família. Para os críticos, o drama retrata a ponte conflituosa da América com a Itália. Cerca de 70 anos depois, o drama se repete na Baia de Todos os Santos. A nossa Paquetá, patrimônio cultural e ambiental baiano, das crônicas de João Ubaldo e da poesia de Mirian Fraga, não se coaduna com a Salvadolores iconoclasta e da especulação imobiliária. Não adianta chorar o leite derramado. A ponte já foi contratada pelo Leão baiano com o Dragão chinês. Cabe apenas analisar seus efeitos.
1º - Perda de atratividade turística da ilha com sua transformação em um grande terminal rodoviário e porto-seco de Salvador. Vera Cruz vai se rivalizar com São Cristóvão, cabeceira da ponte Rio/Niterói, com suas oficinas, armazéns e favelas. Os caminhões bitrem deixarão suas cargas ali e camionetes e vans as distribuirão em Salvador e cidades vizinhas. Pela sua proximidade com o porto, a ilha será um grande parque de containers.
2º - Esvaziamento das atividades econômicas do oeste da BTS sugadas pelo buraco negro de Salvador, que ampliará sua função dormitório, dificilmente dando conta das novas demandas. Nazaré, Valença, Santo Antônio de Jesus, Feira de Santana e o Recôncavo histórico só perderão. Com os novos aeroportos de Ilhéus e Porto Seguro o propalado turismo cacaueiro é mais uma ilusão que uma vacina.
3º - Afundamento da multe centenária navegação na BTS e substituição pela rodovia, enquanto os cariocas planejam ampliar esse modal na Baía da Guanabara. Mas fiquem tranquilos, não desaparecerão as casquinhas-de-nozes para o Mar-Grande, porque os itaparicanos não irão pagar pedágio e não poderem estacionar em Salvador.
4º - Inversão de tráfego de carga na BR-324 e infarto da Estrada do Coco com a invasão dos banhistas do semiárido, com suas marmitas, nos sábados e domingos. Enquanto S. Paulo e Rio criam anel e arco rodoviário para evitar o cruzamento da cidade por veículos com outros destinos, nós preferimos nos crucificar. Ninguém avaliou a gravidade desse atropelo.
5º - Estrangulamento da entrada da BTS, com seus quatro portos internos e inviabilização do estaleiro de plataformas de petróleo de São Roque por limitação de teto.
6º - Por último, mas não por menos, endividamento do Estado nos próximos 35 anos, não só pelos milhares de dólares catados no seu cofre furado, como pela complementação do pedágio para a rentabilidade máxima dos chinas. Já subsidiamos a Arena da Odebrecht, o Metrô da CCR e agora os mandarins.
Um arco metropolitano ferro-rodoviário em torno a BTS chegando ao hub-porto de Salinas da Margarida terminal da ferrovia Pacífico/Atlântico, custaria muito menos e traria benefícios muito maiores ao Estado e sua população. Essa é a tese que este escriba defende há anos.
SSA: A Tarde, 10/01/2021

2 comentários:

  1. A ponte apesar de todas as vantagens e desvantagens modificará o panorama social-cultural de Itaparica e demais cidades,fazendo a integração das cidades e pessoas.É bom que haja uma discussão ampla sobre a construção e seus desdobramentos para os nativos de Itaparica e outras cidades do sul do Estado. Conforme o adágio popular preconiza "não é possível fazer omelete , sem quebrar os ovos"

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  2. O povo baiano deve trabalhar com que dispõe no momento e planejar para o futuro de 10 anos melhorias sugeridas, mas não fazer a obra da ponte causará mais impactos negativos do que positivos para o Estado da Bahia, neste momento de conjuntura desfavorável. Os outros projetos são muito bem-vindos, desde que haja aporte financeiro. Ninguém investe sem fazer uma análise financeira com fatos e dados ou seja quanto custa? Qual que é o tempo de retorno do capital investido? Quais são os retornos sociais? Quais serão os impactos ambientais para o entorno? Não é possível discordar por discordar, sem a quantificar e arrazoados com fatos e dados.

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