domingo, 10 de julho de 2022

O GATILHO E A OMISSÃO

 Antônio Pastori


Dois jovens baianos morreram esta semana, em um intervalo de 24 horas, com motivos diferentes mas que espelham o mesmo signo da barbárie que estamos banalizando a cada dia.

O indígena Elton Barros de Souza (foto 1) foi assassinado na madrugada da última sexta feira (08) durante a invasão de 70 homens armados a um acampamento de um movimento de luta pela terra em Una, no sul da Bahia, Elton foi baleado e queimado ainda vivo. Tinha 21 anos.

Já Guilherme Santos de Andrade (foto 2) cometeu suicídio na última quinta-feira (07) durante a apresentação de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) na Faculdade Baiana de Direito. Tinha 24 anos.
Colegas de sala garantem que Guilherme teria tirado sua própria vida durante a apresentação. Uma das professoras responsáveis pela banca examinadora teria feito duras críticas, desmerecendo, segundo informações, toda a carreira acadêmica do aluno. Ao ouvir as críticas, de acordo com as postagens de colegas da faculdade nas redes, Guilherme desligou a câmera que usava para a teleconferência do TCC e se jogou do décimo andar de um prédio em Amaralina, bairro de Salvador (BA).
No caso de Una, Há fortes e óbvios indícios da morte de Elton estar ligada à truculência explícita e incontrolável de capangas de “novos coroneis da terra” na região do sul baiano. Em menos de um ano, este é o quarto homicídio que ocorre naquela região. Sempre com requintes de crueldade
No também triste caso de Salvador, se forem comprovados a humilhação e rebaixamento vividos pelo jovem Guilherme, o ato de tirar a sua própria vida, traz à tona o velho debate da existência do mundo acadêmico do que chamamos de “PHDEUSES”, professores arrogantes, humilhadores, recalcados, fascistas, vocês escolhem o adjetivo mais apropriado, que costumam diminuir o trabalho de alunos em conclusão de curso. Por que isto acontece? Manutenção de Status Quo? Reserva de mercado?
São simples perguntas. Merecem respostas. E que a população tenha acesso.
E é justamente isto o que chama muito a atenção: a forma como a mídia hereditária vem tratando os dois casos.
Qual a investigação e acompanhamento que estão sendo feitos e apurados da morte sob o signo da barbárie do jovem indígena Elton em Una?
Qual a diferença da morte covarde que Elton sofreu na Bahia com os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips no Vale do Javari no Amazonas? Qual a diferença que existe nesses conflitos e que são cada vez mais graves no sul baiano?
Qual o peso jornalístico dado ao caso? Nenhum.
E vamos lá:
Qual a apuração feita para a linha de investigação adotada sobre o suicídio de Guilherme, estudante da Faculdade Baiana de Direito? Se foi uma transmissão on line a análise do TCC, esta gravação será disponibilizada?
Onde estão as notícias do caso na mídia soteropolitana? Vamos ao jargão jornalístico: onde está a matéria principal? E as suítes?
Outro detalhe, e a apuração? Quais são os componentes da banca examinadora? Era uma professora? Em rapidíssima pesquisa no corpo docente da Faculdade Baiana de Direito são vinte professoras integrantes do quadro da faculdade. Vale a averiguação.
O que não é admissível são esses fatos se tornarem banais. O que não é admissível é o signo do fascismo e da intolerância estarem arraigados ao nosso dia a dia cada vez mais.
Quando virar rotina e sem nenhuma notícia veiculada, estaremos perdidos.
E mais: qual o gatilho que está gerando esta afasia e falta de mobilizações na Bahia?
No caso de Elton onde estão os movimentos sociais exigindo respostas? Movimentos concretos, por favor.
No caso de Guilherme, quais as ações que as instituições de direito na Bahia estão implementando?
E os pais dos alunos da Faculdade? Têm que exigir a apresentação deste vídeo do TCC de Guilherme. Ou vão esperar que a prática se repita com outro aluno ou aluna?
Por fim, a prática de jornalismo nos dois casos? Apurar, questionar, ir a fundo. É fundamental a prática de uma regrinha: sensacionalismo zero e informação acima de tudo.
Ao rever essas últimas linhas, sinto amargura na boca e ceticismo na alma.
A prática insípida do jornalismo que acompanhamos são conviventes com este gatilho armado da barbárie e da omissão social.
E o poço, ao que parece, é sem fundo.


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