segunda-feira, 4 de julho de 2022

VIGILÂNCIA SANITÁRIA

Para quem?

De tanto andar por aí, acabei conhecendo - pelo menos desde a Praça Castro Alves até a Ladeira do Baluarte - cada pedra da calçada, cada beco, cada placa de rua, cada poste. Criei laços de amizade com vizinhos e comerciantes. Observo. Converso. Fotografo. Registro. Tenho meus hábitos. Para andar do lado da sombra, para comprar pão, tomar o cafezinho quotidiano (apesar da tensão alta). E ouço. Um monte de queixas no que se refere aos costumeiros abusos dos governantes e burocracias mil.

No que se refere à vigilância sanitária, então, nem se fala! Mas vamos falar, sim! Chegam sempre aos pares, meio-sorriso, com bloco de papel impresso e caneta na mão. Pedem para ver a cozinha, a geladeira, a dispensa. Sobem. Descem. Se abaixam, abrem portas, passam o dedo na estante, abrem o tampo da lixeira, do vaso sanitário. Aquele espaço entre dois ladrilhos?... Os sacos de plástico... Tem o quê dentro? A data de validade do azeite doce, do açúcar e do sal? E este pedaço de queijo, sem referência? Tem quartos? Quantos cabides no armário? Examinam as toalhas, o teto, o sabonete...

Não é maravilhoso? Estamos num mundo asséptico, higienizado, perfumado que encantará turistas e autóctones! Mas a mínima data vencida, um minúsculo grão de poeira, lá vem advertência e ameaça de multa. Todos os que têm restaurantes e pousadas – em especial quando pertencem a estrangeiros – resignados com a frequência das visitas dos impassíveis fiscais, se queixam da surreal severidade. Para nada serve lembrar que a 10 metros da entrada do estabelecimento o lixo não foi recolhido há três dias, que outros comerciantes depositam sobras de comida a partir do meio-dia para a alegria da ratazana, que o pivete e o flanelinha mijam logo aí na esquina, que padarias, quitandas e botecos são isentos de fiscalização e continuam imundos, entregues ás baratas, ratos e outros insetos... Fiscalização? Só para quem pode pagar multa polpuda!

Porque não exercitam o mesmo poder inquisitivo para os sanitários das escolas do subúrbio e as praias da periferia? E os parquinhos para crianças brincar, como, por exemplo, no Largo do Intendente, alguém foi verificar se a areia - que é trocada década sim, década não – está isenta de focos de bactérias deixadas pelas fezes e urina de cães, gatos e ratos? A mais simples análise em laboratório destas areias seria devastadora. Mas a prefeitura vai multar a prefeitura ou o estado?
Dimitri Ganzelevitch

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