domingo, 28 de fevereiro de 2021

O BAIRRO DE UMA RUA SÓ

 

Estado da rua Direita de Santo Antônio (Centro histórico de Salvador) 
no dia 28 de fevereiro de 2021, após mais de UM ANO de obras.

Bem.... Estou apenas exagerando, pois além da Rua Direita de Santo Antônio, também tem a Ladeira do Boqueirão. Aos olhos do IPHAN, do IPAC e da CONDER, o resto não conta. As ruas dos Ossos, dos Carvões, dos Perdões, dos Marchantes ostentam nomenclaturas poéticas, mas são ignoradas até pela Embasa que levou nove meses para fechar um esgoto estourado na esquina de duas destas vias. Nove meses!

E a Coelba? Um belo dia de fevereiro chega meia dúzia de operários na Cruz do Pascoal e trocam as lâmpadas dos postes por LED. Sendo que até o Largo de Santo Antônio são 23 postes e que é preciso no mínimo 15 minutos por cada troca, pela lógica ficaram na rua durante umas 6 horas. E durante estas 6 horas não teve um só fiscal da Conder para perguntar o porquê desta troca se os postes iam ser retirados em breve (sic)? A Conder faz uma obra deste porte, por mais de um ano e não informa as estatais e a prefeitura? Quanto trabalho inútil e gasto mais inútil ainda! Tudo pago por nós, os habituais contribuintes otários.

O fato de um grupúsculo de colunáveis ter comprado casas na área despertou o zelo desafinado das estatais sob a fiscalização entediada e aleatória do IPHAN. Uma nova abordagem desta parte do centro histórico da primeira capital do Brasil merecia amplo e irrestrito debate tanto da comunidade do bairro como das instituições acadêmicas. Infelizmente a indiferença geral demostra a pouca importância que a cultura e a memória têm na nossa sociedade.

O bairro de Santo Antônio precisa mais que um passeio novo e iluminação a maneira de Ouro Preto. Como não temos agência bancária, somos obrigados a ir até o Pelourinho, o Comércio ou o Campo da Pólvora. Agência de correios? Só na Calçada ou no Corredor da Vitória. Nem farmácia temos. Imaginar um posto policial é louco delírio. Quanto ao problema do estacionamento, as ditas estatais bem que poderiam ter elaborado alguma solução já que é proibido abrir garagem nas fachadas. Por enquanto quem tem carro fica a mercês da boa vontade do larápio.

O IPHAN que não autoriza placas de energia solar nos telhados “porque podem ser vistas do avião” – tente não dar risada - o que não deixa de ser altamente irônico numa cidade com tantas favelas, se mostra totalmente omisso frente a geração espontânea de puxadinhos, antenas parabólicas e caixas d´água. E nem vamos falar de esquadrilhas de alumínio e alterações agressivas de fachadas.

A cereja do bolo – o leitor já está convidado a festa de aniversário – é a famigerada obra da Conder/Pejota que inferniza o bairro desde antes do carnaval do ano passado sem data para terminar. É um flagrante diário de incompetência, falta de programação e amadorismo. Que me perdoa o arquiteto da Conder que respondeu a minhas perguntas com uma arrogância juvenil: “a despeito das reiteradas tentativas de desmerecer o trabalho em execução sem respaldo técnico”. Talvez eu não domine o arquitetoguês, mas de centro histórico entendo com certeza tanto quanto ele. De Alepo a Provins e Salzburgo, de Puebla a Ayacucho e Potosi, e de Marrakesh a Palermo e Granada, passei setenta anos de minha vida visitando demoradamente centros históricos. Sem falar de sítios também tombados pela Unesco.

Mais uma vez, reitero a pergunta: O que a Conder, sem o mínimo conhecimento da problemática de restauração e preservação, continua fazendo - e isso desde 1991! - no centro histórico de Salvador?

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