quinta-feira, 16 de março de 2023

CINCO DIAS CARIOCAS

Meus amigos e conhecidos sabem quanto sou palpiteiro. Alguns até se queixam e lhes dou toda razão. Sou um velho chato mesmo. E não é que nos primeiros dias de março fui convidado a ir ao Rio de Janeiro pela fundação Eva Klabin para fazer uma visita detalhada ao museu e dar palpites?!

Nababescamente tratado num apartamento no Flamengo do tamanho de um campo de futebol com vista panorâmica sobre a Urca e o Pão de Açúcar, almoço caprichado no Jockey Clube - o novo chefe merece todos os elogios -  visita do atelier do artista Jorge Rodriguez-Aguiar na casa projetada por Sérgio Bernardes para sua família no Leblon, descoberta do iogurte grego e concerto celebrando o aniversário de Heitor Villa-Lobos, quem sou eu para ousar me queixar do calor e do custo dos taxis?

Mas como é linda esta cidade! Ampla, generosa, aristocrática, diversa e alegre apesar de uma penca de governadores e prefeitos que dividem sua agenda entre palácios, hotéis de luxo, templos pentecostais e penitenciárias, de todos os infernos ela consegue escapar e continua vencendo pela sua mais deslavada sedução.

Outra realidade enfrentei nos 23 quilômetros percorridos até chegar ao Museu Imagens do Inconsciente no Engenho de Dentro, com direito a linhas amarelas, vermelhas e muitas mais em vários tons de depressão, todas esgueirando-se entre cem favelas e galpões arruinados mal embelezados por imensos grafites de qualidade irregular. Sem falar nas anedotas inquietantes do motorista do Uber.

Mas valeu a aventura. Lá está a obra singular de Nise da Silveira, contemporânea do compadre Carl Jung, aquela mesmo a quem o Jair das Joias recusou o título de “Heroína da Pátria” por total ignorância da trajetória desta destemida pioneira em psiquiatria. Felizmente o Congresso derrubaria o veto absurdo.  Se as duas partes deste modesto e respeitável museu conseguem por milagre manter-se ativas, é visível a penúria geral do quarteirão reservado a saúde mental dos esquizofrênicos crônicos de uma terra que já foi dos tupinambás.

Emygdio de Barros. Um Van Gogh carioca?

Das 350 mil obras guardadas, só pude apreciar parte da farta produção de Emygdio de Barros e Adelina Gomes. O suficiente para fechar minha estadia carioca com chave de ouro. E também o suficiente para contextualizar a exposição que estarei organizando, ainda este ano, na Aliança Francesa de Salvador e no Museu Eva Klabin do Rio de Janeiro sobre o tema da Arte fora das normas.

A poucas semanas de completar 87 anos de andanças por vales e lagoas, como não dar pulinhos (simbólicos!) agradecendo a todos os deuses do planeta, desde os que habitam os pagodes nipônicos e as pirâmides maias até os templos de Luxor e as mesquitas de Sinan? Só me resta agora conhecer a arquitetura de barro do Iêmen, as igrejas de Goa e Maracangalha.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário