A PROPOSTA DO ARQUITETO URBANISTA PAULO ORMINDO DE AZEVEDO
Integração
dos 3 níveis da cidade e do CH ao Metrô
Muito dinheiro já foi investido pelo poder público e privado no nosso Centro Histórico, CH, desde a década de 1980, quando ele foi tombado pelo IPHAN e pela UNESCO. Mas quem caminha pelo Distrito da Sé, pelas ruas do Tijolo, do Bispo, Maciel, Taboão e Passo e no Comércio, saindo da Preguiça e passando pela Praça Cairú e ruas Corpo Santo, Guindaste dos Padres, Julião e Pilar se assusta com a quantidade de sobrados escorados e em ruinas. Algum fator estrutural deve explicar o insucesso daquelas iniciativas
Duas
principais causas explicam o fenômeno, a meu ver. Primeiro seu esvaziamento
funcional, ainda na década de 1970, na primeira administração de Antônio Carlos
Magalhães, quando foi criado um novo centro comercial e de serviços no Iguatemi
e administrativo na Paralela e segundo o isolamento do CH das redes de
transporte devido à sua topografia. Vale lembrar que o núcleo fundacional de
Salvador foi implantado, por razões de defesa, no bordo de uma falha geológica,
a Montanha, e tendo no lado oposto o fosso do Rio das Tripas, atual Baixa dos
Sapateiros. A Colina da Sé era virtualmente um território inexpugnável, especialmente
quando os holandeses, no século XVII, transformam o vale do Rio das tripas em
um dique.
Em 2019, através de convenio
firmado entre a Prefeitura de Salvador e a UNESCO fui contratado pela Fundação
Mario Leal Ferreira, FMLF, para fazer três relatórios sobre o nosso Centro
Histórico (Projeto 914BRZ4021). Não me restringi à analise dos
desastrados projetos Shopping a Céu Aberto e a expulsão de 2.000 famílias de
moradores locais. Quis fazer propostas para dissuadir a ideia de que professores
universitários só sabe fazer crítica.
A FMLF havia contratado uma consultoria
paulista ligada a USP para analisar a mobilidade no Centro Antigo da cidade,
que inclui o CH. Para apreciar seu relatório convocou um grande seminário com
técnicos da Prefeitura, Estado, IPAC-BA e IPHAN. Os consultores usaram a sofisticada
metodologia da Sintaxe Urbana para provar com gráficos e tabelas que só havia
uma maneira de resolver o problema, alargar a Avenida Sete e a Baixa dos
Sapateiros.
Escavar túneis em lugar de
alargar ruas
Fui o único a dizer em bom baianês que eles estavam delirando. Meus
relatórios e propostas eram tão pouco convencionais que nem foram discutidos,
mas por sorte vazaram. A diretora da FMLF, Arq. Tânia Scofield, que sempre me
deu apoiou, me disse que o Prefeito ACM Neto tomou conhecimento e gostou da
proposta, mas não tinha mais tempo de executar e deixaria para seu sucessor. Em
que consistia esta proposta exótica? Eu dizia que a única maneira de integrar o
CH à cidade dinâmica era com vias subterrâneas e aéreas.
Túnel
Campo da Pólvora/Centro Histórico/Comércio
Túnel C. da Pólvora-Comércio
O túnel começaria no nível mais baixo da estação do Campo da Pólvora (cota 38,50), para onde seriam transferidas as borboletas com desvio livre para os pedestres do túnel. Dali seguia em direção ao Comércio com saída na Baixa dos Sapateiros, no estacionamento em frente à ladeira de Santana e outra na prumada da antiga delegacia de polícia existente no Cruzeiro de São Francisco, em frente à entrada do convento, onde seriam instaladas duas cabines de elevadores. O túnel seguia para o Comércio saindo em um terreno baldio na rua Guindaste dos Padres, em frente à rua dos Ourives
Com uma trajetória reta, extensão de 800m e declividade média de 3,5%, essa passarela em túnel contaria com esteiras rolantes para maior comodidade dos usuários. Esse túnel articularia os três níveis da cidade, e os três principais modais de transportes – metrô, ónibus e monotrilho - e colocaria o Metrô a 400m da Baixa dos Sapateiros e do CH e a 800m do Comércio. O fluxo de pessoas nele deve ser tão grande, que garantirá sua segurança. Mas ela pode ser reforçada com pequenos quiosques e licenciamento de músicos ao longo de sua trajetória, como se vê na Europa. Passarelas subterrâneas com esta extensão ligando duas linhas de metrô são comuns em todo o mundo e não são mais inseguras que as ruas. Como o maior beneficiado dessa passarela deve ser o Metrô cabe a ele manter a segurança.
Na sua saída no Comércio
sugeri transformar as ruas dos Ourives e da Argentina em vias de pedestres
chegando até a Avenida da França, por onde deverá passar o monotrilho e estão
localizados os terminais marítimos de cruzeiros e lanchas de Mar Grande. Esse
túnel possibilitaria que comerciantes, consumidores e turistas do Comércio pudessem
deixar seus carros no estacionamento da Arena Fonte Nova, onde existem cerca de
3.500 vagas só utilizadas durante jogos de futebol e shows, e seguirem por
esteiras rolantes até o Comercio.
Viadutomania
Para vencer a topografia, o
Rio de Janeiro possui 22 túneis urbanos. Salvador com topografia também
complicada tem praticamente um só, o Túnel Américo Simas. Em compensação
devemos ter o maior número de viadutos urbanos do país. Até o Metrô que em todo
o mundo é subterrâneo, conhecido no inglês como subway, underground e tube,
em Salvador é aéreo. Até o BRT em construção é em viaduto. É esta cultura
rodoviarista que explica a ojeriza a uma passarela subterrânea. Brasília tem
inúmeras dessas passagens de pedestres para cruzar as grandes avenidas.
Túnel Barroquinha/Estação da Lapa
Outra ligação estratégica para a conexão do Centro Antigo com o sistema de transporte de massa da cidade seria a criação de uma galeria subterrânea permitindo articular o fluxo de passageiros de ônibus vindos das avenidas Barros Reis, Heitor Dias e Baixa dos Sapateiros com a Estação da Lapa do Metrô. Praticamente em nível ela atravessaria por debaixo do Condomínio São Bento, para chegar ao metrô. Correndo a 13,5 m abaixo da Rua do Paraiso, ela deve passar sob as fundações do Condomínio São Bento. Essa galeria teria uma saída junto ao Instituto de Previdência de Salvador, na Av, Joana Angélica, local com grande movimentação de estudantes e funcionários do Colégio Central e moradores da Mouraria
Túnel Barroquinha- Estação da Lapa
Em
novembro passado, a convite do Secretario de Infraestrutura, Luiz
Carlos de Souza, estive em companhia da diretora da FMLF, Arq. Tânia Scofield,
na sede da SEINFRA para discutir o projeto. Eles haviam contratado uma empresa
mineira para avaliar o projeto e queriam mudar a saída do túnel para o pé da
Ladeira da Montanha. Eu e a diretora da FMLF argumentamos que aquele era um
ponto muito conflitivo e que seria melhor manter o túnel saindo no eixo da Rua
dos Ourives, com o que o Secretario aparentemente concordou.
A empresa também sugeriu substituir
os elevadores do Cruzeiro de Jesus por escada rolante na ladeira junto à Ordem
3ª de São Francisco e Cine Pax, com o que concordei, com a ressalva dessa
escada chegar bloqueada até a estação da Baixa dos Sapateiros para dar mais
segurança aos turistas. Sobre as passarelas nem chegamos a falar. Não tive mais
contato com a SEINFRA, mas me alegro em saber que eles estão abrindo licitação
para desenvolver o projeto executivo do Túnel Campo da Pólvora/Comércio, uma
obra muito importante para integrar os três níveis da cidade ao transporte de
massa e facilitar o acesso ao CH.
COMENTÁRIO DO BLOGUEIRO.- Gostei da proposta, ousada e cara, mas que pode solucionar a decadência do centro antigo de Salvador.
Uma observação: A muito infeliz iniciativa da Fundação Mário leal Maia em pedir um projeto a um escritório paulista que, é evidente, nunca botou os pés em Salvador. Alargar a Avenida 7 e a Baixa dos Sapateiros. Só faltou deslocar o Mercado Modelo. Mas nada de esdrúxulo me estranha, vindo desta instituição.
Uma sugestão: Aproveitar esta obra para fazer das paredes um museu de cultura popular.
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